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Os beijos nunca conhecem o que os lábios vão dizer.

 Em um bar, ela de saia justa e camisa mais ainda só me passa um guardanapo com uma marca de batom e oito números escritos. Um sorriso por cima do ombro e por debaixo da franja vira um convite para algo que nunca vi, pensei que esse charme tinha morrido junto com o nascimento da internet. Eu nunca teria reparado nela se ela não tivesse se mostrado, admito. Era só mais uma. Eu não notaria seus cabelos ondulados ou seus lábios pintados, mas ela me notou (o quê ela notou não importa), isso basta.
 Disco os números em meu celular e ligo. Ouço uma voz que deveria ser aguda porém está rouca por cigarros e vejo ela atendendo fora da danceteria.
 - Alô? Quem é?
 - Deu o seu número para outros desconhecidos?
 - Não, mas ainda não sei o seu nome. 
 - Nicolas. Vinte e um anos.
 - Ah, uma criança.
 - E você? 
 - Dezesseis. - Ela sussurra em meu ouvido, marcando minha orelha com batom carmim. 
 Ela não vai para a minha cama naquela noite, me exige um primeiro encontro antes. Com um sorriso de quem promete que vai partir meu coração e um olhar de quem quer carinho, provavelmente os dois são verdade. E quando eu a encontro, ela está transformada. Cabelos lisos, camisa mostrando ombro e jeans velha. Não usa batom, nem nada na cara, somente um olhar insolente e lábios inocentes. Eu consigo beijar ela, mas não me atrevo a passar a mão de sua cintura, cuido dela como se fosse minha, afinal queria que fosse. E tomo cuidado.
 Todo esse cuidado para vê-la com outro no dia seguinte. Mais bonito que eu, mais engraçado do que eu. Ele que segurava a mão dela em público, que a beijava, que a assumia como dele. 
 - Nunca prometemos exclusividade. - Ela diz, quase triste, porém ainda cínica. 
 E em duas semanas, eu falo que estou apaixonado. Ela finalmente chora por minha causa. 
 Infelizmente, uma vez que ela começou, nunca mais parou. Chorava quando eu a machucava, chorava quando me machucava, chorava quando estava feliz, chorava apaixonada. E mesmo com o rímel borrado eu a queria abraçá-la. Por algum tempo. Aos poucos não tanto, aos poucos me cansei.
 A queria longe de mim, adorava sentir as saudades que ela me impedia de ter. E ela percebeu isso, acho que quando eu disse pra ela talvez.
 - Você ainda pode me ligar, sabe?
 Nunca liguei, talvez devesse ou não, mas perdi o guardanapo marcado de batom e sempre tive muita preguiça para procurar. 

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