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Mostrando postagens de maio, 2014

Me sorriu um sorriso pontual e me beijou com a boca de menta.

Naquele momento ele cobiçou a própria mulher. Um beijo que nenhum deles esperava que ocorresse daquela maneira foi um novo desejo despertado. Com suavidade ele roubou daqueles lábios para eles tão corriqueiros uma nova sensação. O beijo tão sempre sincronizado mudou-se. Foi desengonçado, um beijo que o primeiro beijo devia ter sido, parecia ser o último.  Ela somente riu e foi para a ducha quente. Uma ducha íntima que ele não fora convidado. Só podia observar distante, pela fresta da porta. Viu os cabelos longos aos poucos se molharem e a ouviu cantando. Era como um sátiro observando uma ninfa. Naquele momento nada mais era sagrado. Somente ela.  Somente se esqueceu por dois segundos em como esqueceria daquele momento de noite, quando fosse virar para o lado na hora de dormir sem desejar bons sonhos ou dar um beijo. Ninguém tem mais tempo para fantasias uma vez que cresce. Deixaremos isso para os adolescentes.

As mentiras do profeta

Tomava vinho em uma caneca de leite na noite fria e serena. Havia o notebook em sua frente e pensava como iria desenvolver o conto à seguir; se falaria sobre o primeiro amor ou o segundo. Quem sabe até o atual? O professor que tivera um caso obscuro. E então escreve, mas sobre nenhum dos três. Escreve sobre uma mulher que concedeu o perdão, que abriu os braços para o marido bêbado que na embriaguez soluçava perdão pela amante. Iria enviar para a editora. Seria publicada, era de um amigo íntimo dela. Mas ainda assim hesitou ao mandar o email. Em oito anos de carreira nunca tinha hesitado ao mandar um email. Não sabia escrever sobre o que não havia passado. Isso a agonizou. Era uma primeira vez. Teve a mesma sensação de culpa e ansiedade quando mentiu para a mãe pela primeira vez, ou para as amigas de infância sobre o namoradinho. Se havia mentido tantas vezes porque não dessa? Porque essa seria para si mesma. - Está aprendendo Clarice. - riu para si mesma.  - quase me conve

Um presente para as noites gélidas

 Algo de estranho acontece com as meninas quando elas aceitam a  ideia de ter um amor não-correspondido.  Elas viram mulheres.   Já era quase cinco e meia da tarde, e estava escuro como se fosse uma madrugada. Tudo parecia uma madrugada naquela cidade invernal que parecia ter saído de um livro de ficção, aqueles com temática noir, onde sempre se chovia, era frio e sinistro. Mas nada disso impede uma menina apaixonada.   O vento gelado machucava o rosto, os pés, por mais que secos pareciam úmidos e gelados, quase como se fossem gangrenar ou apenas cair. A pele frágil como papel, ressecada, prestes à partir. Mas continuava. Kept on Goin.  Era só um boato, as chances eram pequenas, mas tinha que confirmar. Os olhos, verdes, pareciam negros por causa de toda aquela maquiagem borrada. Ela sabia, os boatos eram verdadeiros.  Ele disse tudo. Primeiro que não significava nada, depois que era culpa dele, então que era a dela. Mas mulher nenhuma precisa virar um mártir para sab

Samba para o com nome de poeta

 Tinham dois olhos que encaravam a minha nuca. Eu sabia deles, sabia que queria encará-los mas ainda não tinha a coragem de tirar o rosto do travesseiro. Encarando aqueles olhos mornos eu teria que responder várias perguntas, perguntas que eu tinha medo e perguntas que tinha vergonha da resposta.  Tomei um trago da pouca coragem que a nudez ainda não tinha levado embora, me protegi escondendo-me debaixo daqueles cobertores não-tão-desconhecidos; sou desarmada com um abraço repentino, e tendo momentos em que só se percebe, que não importa a pergunta, mas é que nem aquela música da Rita Lee que já foi dos Beatles. Ou quem sabe aquela do Caetano? Provavelmente vou acabar me perdendo em Chico, afinal a semelhança é enorme.  Mas no fim, é apenas um Sim.

O amargo da tua boca ainda supera o doce da minha

 Pela primeira vez vi ela acordar. O emaranhado dos cabelos emoldurava o amassado da cara de ressaca. O ronco baixinho de criança e os seios roçando a face. No começo da noite ela tinha se encolhido no meu colo, pelas três da manhã a cabeça estava no meu colo, e agora já estava mais distante, deitada sobre o próprio braço. Abriu os olhos e me cumprimentou com um beijo de boca amarga.  - Quis uma namorada e arranjou outra criança. - Ela ri e vai para o meu banheiro, já sabendo onde fica a pasta de dentes, no meio do trajeto rouba a minha camisa do chão.  Fecho os olhos de novo, ainda era muito cedo para acordar. Não que isso fosse impedi-lá. Me morde com a boca de hortelã.  - Você sabe não é? Minha sede de ti é diretamente ligada à bebedeira de ontem a noite. - Prometo nunca mais deixá-lá sóbria se fosse o caso.  E o dia inteiro passa num bocejo. Ela me dá uma rotina de doze horas baseada em músicas, promessas que não sei se serão cumpridas e a vida re-começa no dia seguinte.

Porque vamos terminar a garrafa - rosas não cliched

 - Eu me assusto com facilidade, por favor não se assuste.  - Não entendo essas coisas de mulher mas sou paciente.  - Ninguém é tão paciente assim.  - Posso tentar.  - E se não dermos certo?  - A vida continua.  - E se dermos certo? Isso assusta ainda mais.  - A vida continua continuando. Só isso?  - Só isso.