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A rainha dos lazarentos

Havia um negro sentado num canto escuro do ônibus. Homem corpulento, de olho esbugalhado e dentes amarelos. A janela que uma madame (provavelmente pegando o ônibus para fazer alguma espécie de aventura) respingava a gélida garoa Curitibana no rosto do pobre carpinteiro, esse por sua vez encarava o chão da Padre Agostinho e como ele ficava embaçado pela velocidade do ligeirinho.
- Com licença,  senhora.  - uma voz doce pediu - Está realmente muito frio. Se incomodaria de fechar a janela?
- Imagine meu bem. Nem percebi que estava incomodando.
E dos 24 lugares vazios que havia no ônibus,  ela se senta naquele canto escuro no fundo.
Cheirava à fruta vermelha e anis e lia um livro. O inclinava um pouco para a esquerda,  para que o passageiro ao seu lado pudesse ler algo e atiçar a curiosidade. Funcionou.
- Sobre o que é esse livro moça?
- Sobre o retrato de um rei e um casal na guerra dos Emboabas.
- História da minha terra.
Os olhos azuis maquiados sorriem para ele.
- É de Minas?
- Cresci em Uberlândia, mas nasci em Goiânia.
- Coincidência. Sou do planalto central.
E a boca pintada de rosa sorri. 
- Posso saber como se chama?
- Para você, Geni.
E então ela leu alguns trechos do livro e explicou o estilo da autora. Comentou com ele sobre Minas,  pão de queijo e piadas de baiano.
- Fique com o livro. 
- A senhora não vai terminar?
- Senhora é a minha mãe. E é a terceira vez que leio...
- Luiz Marcos.
- É a terceira vez que leio,  Luiz Marcos.
E chegaram no terminal em Pinhais.
Ele acanhado, desce e fica em pé ao lado dela enquanto ela colocava um chiclets de melancia na boca. Não ofereceu para ele.
Luiz Marcos teria aceitado. Ele estava morrendo de vontade de comer doce.
- Onde a moça mora?
- No água verde.
- Veio visitar alguém?
- Não.
- Por que veio até aqui então moça?
- Porque todo mundo merece um gosto do amor.
E o beijou, com carinho e suavidade. Beijava bem, tinha os lábios firmes e a língua carinhosa. Deixou-o com o chiclete enquanto ia pegar um ônibus que ia para o boqueirão.

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