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Esqueci os meus sonhos em Paris

Ouvíamos Dig a Pony e ela dançava para mim, rebolava, quase imitava uma serpente; estava feliz, rindo. Movia os quadris de maneira exagerada, não sei se de propósito para tirar sarro ou para me seduzir, a questão é que ela estava sexy na sua regata vermelha com os mamilos acesos e a calcinha branca de bolinhas que parecia um shorts minúsculo. Eram sete e meia da manhã, estaria sol e calor se estivéssemos no Brasil, mas ela me convenceu a vir Para a França, onde alugávamos um estúdio; eu dava aulas na universidade e ela estudava lá (eu era professor de engenharia de alimentos e ela estudava economia). Nosso aniversário de seis anos e três anos morando na França. Em toda sua juventude ela sorri para mim e vem engatinhando se insinuando para mim, até escalar em meu colo. Me beija e dá risada. Eu estava feliz. – O quê você acha da Inglaterra, meu anjo? – Chuvosa. Mal-humorada. – Os ingleses são mais bem-educados que os franceses. – Eles são, mas a aura do país não. Muita chuva. Quer ir embora da França? – Acho que já deu o que tinha que dar. Quero me casar contigo anjo, só estou esperando sua formatura para podermos voltar para casa. Ela me abre os olhos de coruja e abre a boca como se não acreditasse. Uma lágrima cai do seu olho e ela dá risada. – Surpresa? Ela me beija e diz: – Nunca pensei que você me pediria em casamento. – Eu te amo, você me ama, o que falta? Fazemos amor no chão da sala e quando terminamos o sol já está no céu. Eu ligo a televisão e passa um filme sobre um serial killer. – Incrível como as pessoas conseguem comercializar tudo – ela fala, brincando com os pelos do meu peito e procurando espinhas neles – as mulheres estão morrendo e sofrendo ainda com isso e já transformaram num best-seller. – As pessoas precisam de histórias para contar. Melhor que seja do sofrimento alheio. – Que pensamento frio e mesquinho. – Ela me beija – Ainda acho falta de respeito, como tirar foto em museu. É só para mostrar que você viu e parecer intelectual, não quer dizer necessariamente que você conhece algo sobre, ou que entende. – Talvez seja para passar a notícia só. – Então você coloca no jornal, não coloca mil e uma palavras bonitas no meio. – Pensei que você gostasse desse tipo de romance-barra-filme. – Adoro. Mas prefiro que façam que nem Dan Brown, apesar de ser literatura quase juvenil, ele cria uma ficção preservando a imagem dos mortos. Por mais que cague na história, ele não cria nenhuma falsa imagem. Não vitimiza ninguém. Licensa poética tem seus limites. Ela pega a camiseta do Iron Maiden que eu estava vestindo e vai para a cozinha fazer o café da manhã. Eu mimei demais essa garota. Por mais que ela fizesse o equivalente à quatro mil reais líquidos por mês, todos os apetrechos que ela adorava eu que comprei. Máquina de waffle, máquina de cupcake, mixer com 12 funções. Ainda bem que ela cozinhava bem e usava aquilo tudo. Tinha feito um curso de confeitaria durante o nosso tempo na França. Ela fez waffles de banana e panquecas de chocolate para o café da manhã como forma de comemoração. Ela devia ter medo de que eu ia deixá-la em algum momento. Já tínhamos tido esse tipo de conversa, que ela tinha medo que eu ficasse entediado, que ela era muito dramática e muito insegura, que um homem (ela distinguia que ela era uma garota, ainda faltava muito para ser mulher) não ia aguentá-la por muito tempo e então chorava baixo. Ela sabia que eu queria voltar para o meu apartamento no Leblon e ter dois filhos, mas eu sabia que ela queria viver num filme. Eu estava disposto a me casar em Paris com ela e comprar um apartamento de dois andares em Mont Parnasse. Eu seria feliz, seria feliz com ela. Basta, não é? – E então meu amor, quando voltamos para a terra onde canta o Sábia? – Ela sorri e me passa o copo com o suco de laranja.

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