Acordo dolorida. Nem teve nada demais na noite anterior, mas dormir em dois colchões de solteiro com espessuras diferentes. Mas a dor passa ao ver ela usando o meu cabelo de bombril como travesseiro. Até dormindo era a piadista. Me levanto rápido. Ela acorda.
- Aah. - Vira para o lado.
- Bom dia flor do dia.
- Aah.
Lhe tiro o edredom do rosto.
- Vamos lá, você me prometeu me levar para a feira do largo hoje.
- Ahn. E eu vou. - Boceja, com a boca ainda manchada de batom. - Mas precisa me acordar as sete horas da manhã pra isso?
Não respondo, só vejo ela se levantar e sorrio vendo-a rebolar e sorrindo, achando graça. Eu vejo beleza, ela vê piada. Os cabelos normalmente lisos estavam bagunçados. Podia passar a vida vendo ela assim. E ela veste uma de suas camisetas. Uma que nunca vi. Uma do Slayer.
- De quem é essa? - Um ex-namorado assumo, com o ciúmes nascendo de fininho.
- Minha.
- Não creio.
- Te disse que tive minha fase metaleira. - Ela ri, enquanto penteia as madeixas manchadas de sol.
- Ah, pensei que eram só algumas músicas do Metallica e outras do Ozzy.
- Haha, linda a primeira banda brasileira que realmente gostei foi Angra.
- Pensei que era filha de Chico.
- Mas sou ué; contudo, todavia, entretanto fui adotada por Lemmy.
- Você é uma farsa.
A resposta dela é um beijo. E me deixa na cama enquanto escova os dentes. Consigo a ouvir cantando "Chega de Saudades" e volta para mim com gosto de menta na boca e cheiro de frutas na pele. Se ajoelha em mim me olhando. Me sorri e me encara, me beija e me agrada.
- Menina você é toda formosa.
- E você toda gostosa. - Respondo, mordendo-lhe o lábio. Ela só aperta um pedaço de pele e me mostra as celulites. Piadista miserável.
Me faz o café e me serve as frutas. Dança um samba improvisado enquanto arruma a cozinha e eu subo para arrumar a cama.
Quatro meses frequentando aquela morada e nunca tive motivo para fuçar as coisas, mas fico curiosa com o guarda roupa. Três portas de correr. Abro a primeira; calças jeans e camisetas de banda, all stars e uma jaqueta de couro de motoqueiro. Me surpreendo com a quantidade de preto naquilo tudo e em uma bandana do Raul Seixas também. Na porta do meio, vejo três vestidos, sapatos de salto, algumas saias e uns ternos. Vejo o blazer que ela vestia quando a conheci pela primeira vez, risca-giz. E na terceira porta, as saias compridas e os shorts curtos. Rasteirinha e a Carolina que conheço.
- Surpresa?
- Um pouco.
- Relaxa, prometo não ouvir Cannibal Corpse do seu lado.
Mas ela me mostra algumas músicas favoritas dela, uns dedilhados bonitos, uns vocais deliciosos. Nunca tive preconceito com o Rock, mas nunca a imaginei ouvindo. E quando ela consegue me deixar com Goin to California eu subo na garupa da bicicleta dela e vamos para a feirinha, ouvir o cover de Raul Seixas e os garotos da faculdade de música.
Comentários
Postar um comentário