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Confissões de uma Terapeuta Depressiva

 Mesma coisa. Todo cliente é a mesma coisa.
 Uma garota chega e fala que está depressiva. Que não consegue achar nenhuma motivação. Me mostra os pulsos. Cortados.
 Sabe a pior parte? É que eu atendo cinco garotas assim.
 Vocês não entendem como isso enche o saco. Claro, eu já fui assim. Admito. Mas eu era ocupada. Digo, ah, estava sem motivação. Minha mãe me mandava arrumar a casa. Depois ir fazer compras. E para ter uma ideia, o mercado era a seis quilômetros de casa. Ela me dava dinheiro pro ônibus, mas eu comprava um chocolate. Resumindo. Andava doze quilômetros por dia. Sendo seis deles com um peso de seis quilos mais ou menos. Andava isso. Mais o caminho da escola. Resumo. Ficava tão cansada que nem tinha tempo para ser depressiva. O meu tempo livre eu dormia. Minha adolescência foi chata se eu parar para pensar. Por isso virei terapeuta. Porque me disseram que ia ser divertido. Cada paciente uma aventura. Um drama.
 Quem mandou abrir um consultório do lado do colégio mais caro da cidade? Um tédio.
 Ganho uns oitocentos reais a cada adolescentizinho besta. Moro bem. Mas. A vida é um tédio.
 - ... E então... Ele me deixou. Eu não sei o que fazer... - E a garota loira bonita chorava.
 Receitei Valium para ela.
 - Só sei que. Não quero mais viver. Não sei quem eu sou. Ninguém me quer. - A garota morena gordinha soluçava.
 Mandei ela começar a andar todos os dias e a lavar a louça.
 - Estou aqui porque minha mãe mandou. Não tenho interesse. Sei que meus problemas são patéticos. - Disse a roqueira revoltada.
 Receitei Valium e jogo baralho com ela todos os dias. Ela mereceu um presente.
 - ... Tentei me matar hoje... De novo. - A loira disse.
 Mandei ela a merda e lavar a louça.
 Com essa rotina, realmente. Você não aguenta mais. Resolvi me mudar. Abri um consultório no centro da cidade. Nunca mais ouvi falar dessas garotas.
 Só sei que a roqueira acabou tendo uma overdose forçada.
 Acho que devia ter aprendido o nome dela.

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